O documento O Centro de Niterói no Caminho do Capital foi escrito pela Arquiteta e Doutora Professora-Titular da Escola de Arquitetura da UFF, Regina Bienenstein, possivelmente uma das pessoas que melhor conhece Niterói, em todos os seus cantos, buracos esquecidos, problemas, riscos. Eu não acredito numa prefeitura que não leve em consideração o trabalho sério realizado por Regina e o NEPHU.
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O Centro de Niterói no Caminho do Capital
Está em discussão, no município de Niterói, uma proposta de cidade que privilegia o capital imobiliário, oferecida ao Executivo Municipal por três grandes empresas (Odebrecht, OAS e Andrade Gutierrez). Este projeto se utiliza do instrumento Operação Urbana Consorciada (OUC), previsto no Estatuto da Cidade, e propõe a extinção de todas as Áreas Especiais do Centro e suas respectivas normas de uso e ocupação do solo: as Áreas Especiais de Interesse Social (ocupadas por população de baixa renda), as de Interesse Urbanístico (campi da UFF e Caminho Niemeyer) e a de Preservação do Ambiente Urbano. Ou seja, a proposta descarta o processo de planejamento urbano construído ao longo de décadas e sintetizado no Plano Urbanístico da Região das Praias da Baía, de 2002.O projeto de lei encaminhado à Câmara Municipal é generalista. Sem um plano urbanístico que defina com clareza o que irá acontecer no Centro, sua defesa destaca unicamente os problemas existentes na área, que, na verdade, são decorrentes de falta de manutenção pelo gestor municipal. Aponta para a necessidade de incentivo ao uso residencial, desconhecendo que o Centro de Niterói já é caracterizado pela diversidade de usos, de atividades e de classes sociais. É uma área que apresenta, além do uso comercial e de serviços, vários quarteirões com uso misto e residencial. A proposta não detalha nem fixa normas que permitam o controle da região pelo gestor público local, além de não especificar as obras, o cronograma de sua implementação e os respectivos custos.
Conforme alertado pelo Fórum UFF Cidades em diferentes ocasiões, trata-se de uma verdadeira “caixa preta” (ou um “cheque em branco”) que confere “um poder ilimitado à coalizão formada pela Sociedade de Economia Mista proposta e por empresas privadas, sem controle público efetivo”. Isto fica evidente no controle social obrigatório (artigo 33, item VII do Estatuto da Cidade), para o qual o projeto de lei estabelece um Conselho Consultivo com quatro membros do Executivo e apenas dois representantes da sociedade civil, a serem escolhidos pelo próprio Executivo.
A proposta causará diversos níveis de ruptura, não apenas na área específica da OUC, mas terá reflexos em todo o território municipal, ao permitir a compra do direito de ampliação de gabarito para até 40 andares (duas torres no espaço da atual Estação das Barcas) e até 20 andares (vários edifícios no espaço entre o Terminal de ônibus e a Ponta da Areia, e entre o Caminho Niemeyer e a área urbanizada atual), sendo estimado também que estes investimentos atrairão cerca de 40 mil novos moradores para o Centro.
O Estudo de Impacto de Vizinhança,elaborado pelas mesmas empresas que desenvolveram a proposta, reconhece que o projeto provocará aumento no valor dos imóveis, nos aluguéis e no custo de vida.Assume também que acabará por expulsar as famílias de classe média baixa e as de baixa renda, os pequenos comerciantes e as lojas de atacado, o que é considerado, no documento, como efeito “inevitável, irreversível, negativo e permanente”.
O Projeto de Lei reflete uma visão de gestão urbana que privilegia o “espetáculo” e a “imagem”, em detrimento das verdadeiras necessidades de quem mora, trabalha e frequenta a região. Isto fica claro nos exemplos apresentados: grandes prédios muito iluminados, torres corporativas, objetos arquitetônicos estranhos à nossa paisagem, que, aliás, se sobreporiam às edificações do Caminho Niemeyer.
Conforme tem apontado o Fórum UFF Cidades, existem claros riscos de privatização da cidade embutidos nesse projeto. Instrumentos financeiros e urbanísticos moldarão a paisagem, a serviço de empreendedores e investidores, em obediência a um modelo de intervenção importado, repassando à iniciativa privada a gestão do "novo" espaço, com prejuízo à atenção aos problemas sociais e econômicos reais do Centro.
A Prefeitura quer aprovar um projeto de tamanha magnitude em pouco mais de dois meses e argumenta ter realizado muitas reuniões, com diferentes segmentos, o que caracterizaria a disposição para o debate democrático. Não considera que processos efetivamente participativos exigem disposição para enfrentar, escutar e avaliar críticas e propostas, e ser capaz de incluí-las ou, pelo menos, esclarecer porque não foram aceitas. Nas duas únicas Audiências Públicas, promovidas pelo Legislativo Municipal, e nos debates promovidos pela Escola de Arquitetura e Urbanismo - UFF e pelo Ministério Público, uma sucessão de opiniões divergentes, dúvidas técnicas e propostas de alteração foram encaminhadas por vários setores da sociedade, sem que nenhuma modificação tenha sido feita no projeto de lei que tramita na Câmara.
Temos nos posicionado pela imediata revisão do Plano Diretor aprovado em 1992. O Executivo, como enfatizou o Vice-Prefeito, recusa tal proposta, com o argumento de que imobilizaria a gestão “por até três anos” e impediria a realização de ações importantes para a cidade. Ora, esta afirmativa é falaciosa, pois a elaboração de um Plano Diretor não demanda um longo tempo e não impede a implementação de ações já estudadas e planejadas para a administração cotidiana da cidade. E Niterói já tem alguns Planos que esperam por ser implementados, entre eles, o Plano Local de Habitação de Interesse Social e o Plano Municipal de Redução de Risco, este último de suma importância para evitar novas tragédias, como as já vividas pela cidade em 2010.
O Fórum UFF Cidades tem defendido a recuperação do Centro de Niterói dentro de uma perspectiva social e inclusiva que deve começar com a aplicação de instrumentos do Estatuto da Cidade que contribuam para assegurar a função social da cidade e da propriedade. Em vez de torres que se destacam na paisagem, em conflito com as edificações do Caminho Niemeyer e com a própria ocupação atual do Centro, nossa proposta volta-se para a escala humana e para as reais necessidades da população. No lugar de uma “revitalização” baseada na atração do grande capital imobiliário, que expulsará a população e as atividades tradicionais, nossa proposta aponta para a melhoria dos serviços urbanos; para o estímulo ao aproveitamento dos imóveis vazios e subutilizados como moradia popular e de classe média; a organização do dinâmico comércio popular; a valorização do comércio já presente na área e o incentivo à recuperação do patrimônio edificado.
Por tudo o que foi mencionado e por existirem alternativas que não acirram a exclusão sócio-espacial, o Fórum UFF Cidades defende a imediata retirada do projeto de lei da OUC / Centro de Niterói da Câmara Municipal e reafirma a urgência da revisão do Plano Diretor, iniciativas que permitirão abrir o debate sobre a política urbana e a cidade desejadas pelo cidadão niteroiense.
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Para saber mais sobre o NEPHU-UFF e seu papel na gestão de uma Niterói mais justa, e com melhor qualidade de vida para TODOS, sem demagogia e com muito trabalho sério, leia aqui, aqui e aqui. E para conhecer um pouco sobre a História de Niterói e alguns de seus personagens, leia aqui.@rodrigoptneves Única opção viável para #Niteroi é proibir novas construções até que toda infraestrutura seja revista e modernizada.
— Vicky Londres (@vickylondres) July 22, 2013
Até porque a cidade não precisa de mais prédios, nem de novos moradores. Muito menos, de mais carros.
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